O racismo estrutural pode ser visto em diversos aspectos da sociedade brasileira.
Um levantamento da Agência Lupa revelou que, embora pretos e pardos sejam 56% da população brasileira, são 64% das pessoas sem emprego e 66% das pessoas que trabalham menos tempo que gostariam. Ainda, em 2018, 47,3% das pessoas pretas ou pardas ocupadas trabalhavam no mercado informal, enquanto entre brancos esse número é de 34,6%.
No campo, esse cenário não é diferente.
Para demonstrar isso, fizemos um cruzamento dos dados do Censo agropecuário (2017) com os da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio, e comparamos a proporção de população branca por unidade da federação com a proporção de pessoas brancas donas de lotes de terra acima de 1.000 ha.
Os resultados estão sintetizados a seguir.
A comparação entre as duas figuras revela que a população branca é maioria entre os grandes proprietários de terra em quase todas as unidades da federação.
As maiores distorções ocorrem nos estados do Mato Grosso (MT), Bahia (BA) e Tocantins (TO). No MT, apenas 29% da população é autodeclarada branca. Já entre os grande proprietários, esse número é de 77%. Na Bahia, somente 19% da população é branca, enquanto que pessoas pertencentes a essa raça são donas de 60% dos grandes lotes de terra no estado. No Tocantins, os números são 20% para população geral e 61% para os grandes proprietários.
Quando analisamos os números nacionais, nossa hipótese fica ainda mais clara: dentre as propriedades com mais de 1.000 ha., 67,5% dos donos são brancos. Entre as propriedades com menos de 1 ha., 79,9% pertencem a pretos, pardos, indígenas ou amarelos.
Muitas são as possíveis causas para a essa desigualdade racial na divisão de terras do Brasil.
Devemos lembrar que, desde a divisão da América Portuguesa em Capitanias Hereditárias, europeus e seus descendentes tiveram acesso a doações de grandes porções de terra.
Mais tarde, em 1850, com a instituição da Lei das Terras, todas as terras ainda não habitadas do território brasileiro só poderiam ter uso para fins de cultivo e ocupação se compradas à vista do governo, o que privou muitos ao acesso democrático a um lote de terra para a sobrevivência e consolidou o modelo latifundiário no país.
Apenas 38 anos depois, em 1888, ocorreu a assinatura da Lei Áurea que, sem qualquer indenização aos ex-escravos, pôs fim ao regime de escravidão no país. Como essas pessoas, sem qualquer apoio financeiro, social e jurídico, poderiam comprar terras à vista?
Entende-se aí a gênese de mais um capítulo da desigualdade racial no Brasil, ainda tão presente em diferentes espaços e contextos sociais.
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